Fabinho sabia muito bem disso, ele que desenvolveu essa lógica fantástica. Qualquer guarda-chuva te oferece meia proteção, as pernas sempre ficam molhadas, dependendo do tipo de chuva só a cabeça fica seca, sem contar que se for uma tempestade com ventos acima de 30 km/h seu guarda-chuva vira do avesso. (quem se arrisca sair numa tempestade?)
Debaixo de uma árvore observando a chuva molhando o campinho de futebol; onde passará por algumas frustrações, não é fácil ser péssimo no esporte em que todo mundo joga razoavelmente bem. Fabinho acumulava coragem para encarar a chuva, sentia um tipo de controvérsia científica, na teoria a ausência proposital do seu guarda-chuva era um benefício, na prática não queria se molhar.
Faltava coragem para o teste definitivo, no caminho da escola até ali conseguiu se abrigar debaixo dos beirais ou toldos dos comércios do bairro, mas o campinho de futebol era a maior área aberta, ele teria que atravessar andando, pois correr na chuva é errado, você se molha mais rápido.
A lógica de Fabinho era quase uma fórmula matemática:
Quanto maior o guarda-chuva, maior o incômodo de carregar mais um objeto que não cabe na mochila, não cabe dentro da maioria dos armários escolares, e é maior a chance de você perder ele. Se você optar por um guarda-chuva pequeno, menos proteção ele te oferece, logo mais inútil é.
As folhas da árvore começavam a pingar, a chuva estava ficando mais forte, os raios assustavam com seus estrondos, o arrependimento de não ter levado o guarda-chuva só não era maior porque Fabinho sabia onde estava seu guarda-chuva, sabia que assim não perderia ele dessa vez. Ao longo da sua pequena vida Fabinho já tinha perdido muitos guarda-chuvas, o medo de perder mais um obrigou a criar um teoria sobre a inutilidade do guarda-chuva ao longo da sociedade contemporânea.
Ao carregar um guarda-chuva os transtornos estão presentes em 100% do tempo, chovendo ou não, é um transtorno tão grande que quando você se livra dele sente um alívio incomparável, tanto que seu subconsciente apaga essa informação da sua memória, isso é involuntário, é o instinto humano.
Mesmo que algumas poucas pessoas do mundo gostam de se torturar lembrando de pegar o guarda-chuva molhado dentro de um balde ou pendurado em qualquer outro lugar, é muito comum esquecer esse objeto inútil em qualquer lugar.
Fabinho começou sua marcha andando numa velocidade rápida mas não correndo, as gotas grossas molhavam muito de uma vez só, seu óculos ficou encharcado atrapalhando a visão. No meio da travessia começou a calcular as consequências de chegar em casa completamente molhado, a essa altura a chuva estava muito intensa, era aquele tipo de chuva que nem mesmo de guarda-chuva dava para encarar.
Na outra ponta do campo tinha uma enorme poça d'água, se esticou todo para pular, mas com a visão comprometida pelo excesso de humildade no rosto, enfiou o pé direito com tudo dentro da poça, depois disso ignorou qualquer teoria e seguiu seu instinto e correu rápido para casa.
Chegando em casa completamente molhado foi tirando o tênis e a meia, logo sua mãe gritou de algum lugar da casa.
— Fabiano Correia!!! Cadê seu guarda-chuva novinho!!!
Ele olhou para dentro procurando sua mãe, mas a cozinha estava desabilitada.
— Tá tudo bem mãe, eu só esqueci meu guarda-chuva.
— O que ?!!!! - a Voz ecoou pela casa, era óbvio que ela estava na parte de cima aquele Confortável sobrado. —Outro guarda-chuva perdido meu filho, eu não aguento mais comprar guarda-chuva para você, não é possível uma coisa dessas.
Fabinho subiu a escada até encontrar sua mãe, ela numa cara espanto, soltando fumaça pelo nariz.
— Você quer pegar uma pneumonia, Fabiano??!!!
— Não mãe, você não entendeu, esqueci o guarda-chuva em casa, não perdi nada.
— Mas você está todo molhado!
— Só que eu sei onde está o meu guarda-chuva
— Sabe mesmo?! -
— Sei sim está no meu guarda roupas.
— Então vai lá e pega ele, traz aqui para eu ver.
Fabinho entrou no seu quarto tremendo de medo. E se ele tivesse levado para escola? E se o subconsciente tivesse apagado essa informação, ele perderá outro guarda-chuva? De novo?
Abriu o guarda-roupa e não viu nada além de roupas, procurou nas gavetas, vasculhou no fundo e nada.
Pensou em pular pela janela e fugir de casa para não enfrentar a fúria de sua mãe, procurou pela segunda vez e nada, realmente perderá o outro guarda-chuva.
— Não encontrou?! - falou a mãe.
— Eu tinha certeza que guardei aqui, eu não perdi outro guarda-chuva, alguém mexeu nas minhas coisas.
— Hoje de manhã coloquei ele dentro da sua mochila.
— O que?
Fabinho foi correndo do quarto para o corredor, desceu a escada e avançou na mochila molhada. Abriu o zíper e viu aquela coisa escura toda enfiada apertada entre os livros, o tempo todo esteve com ele desde que saiu de casa pela manhã. Isso derruba sua teoria, isso mudo tudo, nada mais fazia sentido ele tinha sido traído pelas próprias idéias.
— Está aí! Agora vai tirar essa roupa molhada e tomar um banho, hoje você está de castigo sem vídeo game.
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